Recentemente, foi fundada a KFL, sigla inglesa para Liga de Amizade com a Coreia, organização dissidente da KFA, sigla inglesa para Associação de Amizade com a Coreia, estabelecida por Alejandro Cao de Benós em 2000.
A ruptura deu-se principalmente pelas polêmicas envolvendo o líder da KFA, Alejandro, exibidas no documentário "The Mole", e pelo debate sobre a aceitação de figuras de viés nazista e sionista dentro da organização, que causou indignação em muitos membros em diversos países.
Meu foco não é dizer quem está "certo" ou "errado". Juízo de valor deixo para os leitores. A intenção é apresentar um acontecimento relevante que, de certa forma, ainda está em pleno curso e pode culminar em um grande escândalo posteriormente, servindo de combustível para os veículos de imprensa anti-RPDC.
A intenção deste blog nunca foi, nem será, atacar ninguém, tampouco apoiar ou encobrir verdades. Por isso, nesse artigo, vou abordar algumas questões sobre essa divisão de modo equilibrado, apresentando opinião ao fim, mas sem exaltar ou atacar alguma das partes.
Documentário "The Mole", falas de Alejandro e acusações graves
Em 2020, foi lançado um documentário anti-RPDC sob a direção de uma figura anticomunista que infiltrou-se na KFA com o fim de ganhar a confiança de sua liderança e "revelar" supostos crimes cometidos pela RPDC.
A descrição do documentário é grave: "revela distribuição ilegal de armas em larga escala, laboratórios de metanfetamina e lavagem de dinheiro".
De forma dissimulada, o protagonista do documentário mostra-se interessado em promover negócios com empresas da RPDC através do líder da KFA, fazendo toda uma trama sobre um "Estado pária" que supostamente comete todo tipo de crimes impunemente. Várias das alegações não foram provadas, exceto a ligada ao comércio de armas, já que apresenta um suposto documento que seria a prova. Porém, o que mais chamou a atenção foi a postura da liderança da KFA e suas falas.
Durante o documentário, além de ressaltar que a RPDC não precisa cumprir qualquer responsabilidade internacional e que organismos internacionais não podem exercer poder no território norte-coreano, o líder da KFA profere declarações polêmicas como "O negro tem essa coisa. No momento em que você não olha para eles, eles roubam tudo de você, até mesmo uma gota de água. E eles precisam sempre ter uma pessoa em cima deles, dizendo o que fazer. Se não, eles apenas dormem ou roubam. Dormem ou roubam. Se o mestre branco não estiver lá, eles se sentirão como animais e destruirão tudo."
Com isso, esse documentário, que visava atacar a reputação da RPDC, também causou problemas internos na "principal" organização de amizade em nível internacional, já que mostrou atitudes e falas controversas da liderança da organização.
É evidente que o documentário foi feito de forma a cumprir da melhor forma seu objetivo: difamar a RPDC. Para isso, foram feitas edições e recortes capazes de reforçar seu ponto. Todavia, será que forjariam até as falas do líder da KFA, incluindo a declaração controversa citada anteriormente?
Bom, pelos relatos que tive acesso, a liderança afirma que estava atuando e, quando questionada de maneira mais profunda, recusa-se a dar satisfação e exige lealdade absoluta
Nazistas e sionistas na organização: aceitar ou não?
Além da polêmica fala do líder da KFA no referido documentário — que ele nem sabia que estava participando, já que foi "às escondidas" — as denúncias sobre figuras que compartilham simbologia nazista e/ou possuem afiliação partidária de extrema direita, e outras que defendem o regime sionista de Israel, dentro da KFA, foram levantadas em vários países.
Apesar das reiteradas denúncias de membros da organização sobre essas posições políticas controversas e contrárias aos princípios que a RPDC defende, as figuras foram mantidas com a justificativa de que, se a posição "não afeta diretamente o apoio à RPDC", não deve ser considerada como motivo para expulsão. Isso causou uma revolta suficiente para a saída dos "dissidentes", que formaram a KFL.
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Atividades controversas no seio da KFA |
Seu site diz o seguinte: "A Liga de Amizade com a Coreia (KFL) é uma organização internacional dedicada a promover a amizade, a solidariedade e o intercâmbio cultural com a República Popular Democrática da Coreia (RPDC).
Nossa missão é construir pontes de cooperação entre diferentes nações e culturas, fornecendo uma plataforma para entendimento mútuo e troca de conhecimento sobre a história, o socialismo e a cultura coreana. A KFL trabalha para fortalecer os laços entre a RPDC e o resto do mundo promovendo eventos culturais, educação política e diálogos internacionais."
Em vista dessa descrição, pode-se observar que, em objetivo, a KFL não é diferente da KFA, que diz ter praticamente os mesmos objetivos. A questão central está na dissociação da figura de Alejandro Cao de Benos e de figuras reacionárias presentes na KFA. Não há, porém, confirmação sobre "reconhecimento por parte da RPDC". Não sabemos como a RPDC reagirá em relação a essa divisão. Normalmente, as organizações norte-coreanas vinculadas com essas relações de amizade com estrangeiros não costumam impôr muitas condições, "aceitando" até diversas organizações parecidas de um mesmo país que, por algum motivo, não se unificam. Porém, como o caso é um pouco mais complexo, fica essa dúvida no ar.
A KFL já possui representações em oito países e mais de 500 membros, além de alguns cargos em nível internacional. Está em "fase de crescimento", buscando atrair novos membros para compor sua organização e ganhar força. Nesse processo, porém, surge a dúvida sobre "princípios" para ingressar na organização, já que foi justamente uma "porta aberta" que permitiu a entrada de figuras controversas na KFA. Qual posição a nova organização de amizade com a Coreia tomará, seja em nível internacional ou por país, é uma questão em aberto.
Difamação contra a KFL por membros da KFA
Com o surgimento de "dissidentes", estava claro que críticas surgiriam de ambas as partes. A questão é que a crítica foi além de acusação de "sectarismo". Algumas figuras classificam a KFL com uma organização de "pessoas que ouvem K-POP e são contra o sistema de mísseis da RPDC", criando desde já uma linha divisória encarada como "fronteira" entre os "verdadeiros" e os "degenerados".
Contudo, não é possível definir se trata-se de uma disputa de linhas "direitista" e "esquerdista" dentro do "movimento", já que ambos reúnem pessoas com pensamentos e gostos diferentes, sendo qualquer generalização errônea.
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O que temos de concreto é um conflito que segue em curso, podendo resultar em mais perdas de membros pela KFA, o que levanta o questionamento sobre como os defensores mais ativos da organização mais antiga e detratores da KFL procederão.
É possível até mesmo que filiais da KFA deixem de existir. Por outro lado, operações para vigiar o que acontece do outro lado podem estar em pleno andamento neste exato momento.
Na minha honesta opinião, as organizações cometem erros e precisam praticar a autocrítica, independentemente de qual seja a sua natureza. Por outro lado, apontar um erro não garante que ele não será repetido (por quem apontou o dedo), nem que outra falha não ocorrerá.
De acordo com minha vivência, posso dizer que as organizações de amizade com a Coreia, de forma geral, são extremamente ramificadas e possuem uma forte tendência centralizadora e personalista. Práticas de exaltação da liderança local e da internacional, falta de autocrítica, comodismo, aceitação indondicional, difusão de esteriótipos para justificar seus pontos, exploração de membros "inferiores" (em cargo) para atividades mentalmente cansativas, dentre outros, são defeitos comuns nessas organizações.
Tudo isso contribui para uma visão esteriotipada sobre os "defensores do regime norte-coreano" difundida pelos reacionários, inclusive em alguns veículos de imprensa de grande alcance.
Sendo assim, aqueles que, como eu, são independentes, não estando em nenhuma organização — sendo alvos de assédio daqueles interessados (em explorar) seus conhecimentos para o fortalecimento de sua organização e chamados de "ermitões"—não podem simplesmente tomar parte de um lado, sabendo que, embora alguma parte possa estar "correta" na opinião pessoal do indivíduo sobre determinada situação, ambas possuem suas incosistências.
"Sem a crítica não pode haver desenvolvimento." Kim Il Sung
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